SILVA PORTO - BIÉ- (1840)

                                        
                                                              António Francisco Ferreira da Silva Porto:
                                  Historiador, explorador, político, diplomata, comerciante e africanista português. 


A cidade de Silva Porto, capital do Bié, em gentio Viyè, apareceu sempre grafado em português Bihé, e depois Bié, planalto central de Angola e marco geodésico e trigonométrico que determina o centro de Angola.
Em 1560 o padre mártir Dom Gonçalo da Silveira passou pelo planalto do Bié, na sua missão de evangelização na África Austral.
Na segunda metade do século XVIII os portugueses começaram a interessar-se pela região. 
A ligação da economia atlântica ao interior fazia-se através de ligações de redes comerciais a partir do litoral (Loanda, Benguela, Ambriz) atingiam a periferia apoiando-se em áreas intermediárias de comunicação  e entrepostos de comércio, os principais entrepostos de longa distância foi a partir do Século XVIII até princípios do século XX na região do Bié. Facultando um fácil acesso a Benguela e Loanda e constituindo uma excelente base para chegar aos mercados da África Central, chamada «fronteira luso-africana», (no Bié começou após a criação da capitania-mor em 1769).
Em 1750 os portugueses estabeleceram um posto comercial em Ekovongo primitivo centro do Bié. 
Em 1769, no Governo de D. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho, no planalto do Bié foi fundada uma capitania-mor, uma missão católica e uma povoação a que se deu o nome Amarante. 
Ainda em 1769, no Governo  de D. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho, a capitania-mor (posto militar avançado) do Bié foi transferida para o Huambo e foi fundada uma sede de uma missão católica e uma povoação a que se deu nome Nova Golegã. 
Em 1772 foi nomeado como primeiro Capitão-mor e juiz da Província do Bié, Joaquim Rodrigues, que se instalou em Ekovongo principal sobado da região.
Em 1843, o então Governador- Geral da província Angola, José Xavier Bressame Leite, orientou o comerciante português Joaquim Rodrigues Graça para explorar as matas do Bié, visando a tomada de posições para a ocupação do território. Angola era assediada por estrangeiros, os ovimbundos ( etnia bantu) da tribo Ovimbundu em Ekovongo eram conhecidos por venderem cativos das tribos vizinhas como escravos para os comerciantes europeus.


   António Francisco Ferreira da Silva, nasceu a 24 de Agosto 1817, numa família pobre na cidade do Porto, seu pai distinguira-se nas batalhas contra as invasões francesas em 1810. Na infância, após se alfabetizar, procurava oportunidades mais longe, o Brasil era um destino óbvio, onde muitos portugueses então obtinham sucesso. Com a autorização do pai, embarcou para o Rio de Janeiro a bordo do Brigue Rio Ave em 1829, tinha apenas doze anos.                       

                                                                  Brigue "Rio Ave" ancorado no Rio Douro, 1890.
                                                    
                                         
No Rio de Janeiro empregou-se como caixeiro e, percebendo que seu futuro ali seria restrito. Em 1835, com 18 anos, foi para a Bahia onde iniciou a trabalhar como caixeiro para um comerciante, nos dois anos seguintes indignado com a remuneração, abandona o emprego e continuou a trabalhar como empregado de balcão de um comerciante de cafés. Na Bahia, António Francisco Ferreira da Silva acrescenta ao seu nome "Porto" em homenagem à sua cidade natal, e fez questão de anunciar o seu novo nome, no jornal Correio Mercantil (um jornal importante na época): doravante se assinaria António Ferreira da Silva Porto.
Dois anos depois, no cais da Bahia tem conhecimento da partida de um navio para África/Angola, sem fazer a mais pequena ideia onde ficava Angola e do que lá vai encontrar, como "confessaria mais tarde”. Desembarca em Loanda, porém, não o fascina particularmente e, permaneceu por pouco tempo, indo depois para Cabo Verde, onde ficaria ainda menos tempo. Regressa ao Brasil, à Bahia, onde encontrou um clima de grande agitação política. Deflagrara há pouco a chamada revolta do Sabino e, como a instabilidade política é inimiga dos bons negócios, revolve voltar a Angola, na capital angolana emprega-se numa taberna como marçano. 
António da Silva Porto não é pessoa para estar parado atrás de um balcão. Por várias vezes embrenhou-se na selva nas periferias de Loanda. Com os primeiros salários, compra vários artigos de mercadoria. Quando julga ter artigos suficientes, deixa a taberna. Em 1839 penetrou as planícies internas de Loanda comerciando e travando relações com novas tribos, e abre uma loja no interior de Loanda. Tinha 22 anos. Progressivamente foi sendo fascinado pelo interior do território. Que  irá absorvê-lo por mais de 50 anos, e onde se iria iniciar na vida de explorador. 
Em 1841, desceu por Benguela, aventurou-se numa viagem pelo interior da África Central, para iniciar a sua carreira de explorador e comerciante no interior. Tinha 24 anos. Começou por se integrar numa caravana comercial que tomou rumo em direcção à linha do rio Cuanza, passando pelas localidades do Dondo, Lukala (Lucala-Cuanza Norte), Mpungu a Ndongo ( Pungo Andongo) Kasanji, (Cassange), Musende (Mussende-Cuanza Sul). Explorando as selvas das regiões do Lui pelo rio Lutembo e do alto Zambeze, pelo Riambeje. 
Foi uma aventura difícil: muitas das caravanas que deixavam a costa de Benguela para o Lui, Loanda e Katanga arriscavam roubos, pilhagens e o risco de se verem envolvidas nas guerras tribais.
Silva Porto embrenhou-se nas selvas, e iniciou a explorar as planícies do interior, e percorreu muitas zonas do interior nunca antes visitadas por europeus. Seguindo a estrada para Luau, Lutembo (Gago Coutinho) e do Alto Zambeze, (no Moxico). Fez amizade com os sobas mais importantes, abrindo o comércio, permutando produtos europeus por africanos: marfim, cera, goma copal (resina), e urzela (uma espécie de fungo para tingir têxteis). Actividades sempre anotadas nos seus diários que se tornariam famosos. 
Comerciar nas selvas pode ser um negócio próspero mas encerra múltiplos perigos. As caravanas que partem do litoral de Benguela para o Lui, Lunda e Katanga estão à mercê de todo o tipo de roubos, pilhagens e cobrança de imposto abusivos por parte dos sobas. E é frequente ser-se apanhado no meio de uma guerra tribal. Por isso, há que conhecer o terreno e travar amizades com o gentio, à partida avesso ao europeu. 



Em 1845, António Ferreira da Silva Porto, com 28 anos, e uma larga experiência acumulada, para a sua idade, decidiu fixar-se definitivamente em Benguela. Construiu uma casa na Bemposta, arredores de Benguela, onde encontrou uma grande solidariedade entre os comerciantes da praça e o apoio da família do Capitão-Major Francisco José Coimbra, mestiço, nascido na Caconda, foi enviado para representar os interesses portugueses, revelando como as pessoas de diferentes origens interagiam no interior de Benguela. O Major Francisco José Coimbra colocou Silva Porto em contacto com o soba da tribo próxima a Benguela. 
Quando aí se instalou, Silva Porto integrava a segunda geração de comerciantes e fazendeiros. O desenvolvimento desta convivência permitiu-lhe criar laços de amizade com os membros da tribo que, por sua vez, facilitou o acesso ao soba no Ekovongo (nome dado pelos indígenas ao antigo centro do Bié), com vista à concessão de um espaço, a fim de se instalar, mediante a celebração de um pacto de fidelidade. É com base neste pacto que Silva Porto se instala nas margens do rio Cuito, num lugar situado a pouco mais ou menos 10 quilómetros de Ekovongo.
Na parte mais elevada de um outeiro, lugar muito bonito, e constituindo um ponto estratégico, cuja vertente norte descia suavemente em direcção ao leito do rio Cuito que corre a leste para o rio Kukema (Cuquema), funda o que designou como libata (Embala ou Sanzala) e dá nome Belmonte ao local. A primeira descrição sobre Embala de Belmonte foi dada por Roberto Ivens "Dentro um laranjal, onde as laranjeiras estam sempre em fruto e flor, o que não acontece a outras algumas no Bihé. O laranjal e cercado de uma sebe de roseiras, que attingem uma altura de tres metros, e estam sempre floridas."( De Roberto Ivens  de Angola a Contra -Costa).


 Gravura da Embala de Belmonte nas imediações do rio Cuito:
Silva Porto alojou na sua casa o Major Serpa Pinto, quando adoeceu durante a sua expedição, em 1878.  E acolheu os restantes exploradores Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens.
    
                                  Belmonte, a Embala (casa) de Silva Porto, 1878, segundo um croquis de Silva Porto,
                                                                      na Sociedade de Geografia de Lisboa.


No Bié, iniciou a sua frequente e sucessiva jornada ao comércio que abriu em Benguela. Com esses dois pontos de apoio, estabeleceu uma rota comercial para o seu negócio que abrangia a cidade de Benguela, no litoral, e várias povoações do interior. Contratava estafetas e carregadores para formar caravanas que ele próprio acompanhava sempre que podia. Silva Porto criou uma enorme empatia com Africa, e rapidamente se tornou o mais estimado e mais famoso dos comerciantes. E, iniciou a partir do Bié a exploração de Barotseland  ou Barotzelândia, região localizada entre Angola, Namíbia, Botswana, Rodésia, e Zâmbia, seguindo o curso dos rios Lutembo e Lyambezi, Katongo (Lwi) e no Kuchi (Zâmbia).  Silva Porto tinha por hábito anotar num diário todos os acontecimentos do dia, incluindo aventuras, rotas percorridas, produtos comercializados, contactos, etc. Belmonte a Embala casa de Silva Porto,segundo um croquis de Silva Porto,na Sociedade de Geografia de Lisboa.


                                                                     Mapa das Viagens de Silva Porto.


No período de 1845, Silva Porto associou-se ao grupo de cerca de 200 fazendeiros, que fixaram residência na praça comercial do Bié. O grupo  criou aí condições para se estabelecerem para uma vida mais sedentária, e formaram um centro de união no chamado njangu (caminho) de Amarante a povoação situada próximo da capitania-mor, uma espécie de colonato, e aí fundaram uma escola, uma igreja e um hospital.

Os fazendeiros criaram redes comerciais e, desse modo, caravanas comerciais acorriam às feiras munidos de diversos produtos manufacturados oriundos da Metrópole, de Loanda e de Benguela, sobretudo fazendas, para serem trocadas por cera, marfim e outros artigos. Silva Porto no período de 1843 a 1846, mantinha contacto com a praça de Loanda. 

No Bié, Silva Porto ajudou a missão local, disponibilizando do seu dinheiro para material escolar, alimentos e roupas para as crianças e remuneração para o professor.  A base de formação de Silva Porto assentava na religião católica. No entanto, conviveu com gentios, interpretando-os a partir da concepção religiosa do universo católico.
Em 1848, Silva Porto foi nomeado Capitão Donatário interino  (capitão-mor) da região, realizando grandes esforços para assegurar o prestígio das autoridades portuguesas ante as invasões estrangeiras e as ameaçadoras tendências dos gentios. No exercício destas funções revelou ser um verdadeiro diplomata. Uma das suas primeiras medidas foi reunir todos os brancos, portugueses e estrangeiros que habitavam a região no intuito de conseguir que o soba Lhiumbulla obstasse a que "quimbundos" e "guanguelas" acabassem com os sequestros que faziam aos comerciantes brancos. Mas o soba Lhiumbulla morreu durante uma guerra com outra tribo e, vendo-se na impossibilidade de recorrer ao novo soba, Silva Porto é obrigado a apelar ao Governador-Geral de Angola para que o Bié fosse ocupado militarmente, garantindo os interesses dos portugueses ali residentes. Mas a voz da experiência não foi ouvida. 
Silva Porto aprendeu o dialecto Umbundu e, na Embala, ensinava os gentios a falar e a  escrever  a língua portuguesa, durante um processo de alfabetização, ensinando todos os seus educandos da sua responsabilidade. 




Por volta de 1850 a exploração portuguesa em África expandira-se, mas o pedido de Silva Porto para um destacamento militar nunca foi atendido: Portugal estava só preocupado com a costa que era assediada por estrangeiros. Em 1853 Silva Porto organizou uma expedição a pedido das autoridades portuguesas. A intenção era, mais uma vez, ligar Angola a Moçambique por terra, e ele próprio comandou o grupo. A viagem não correu bem, deparou-se com guerras tribais, e ele teve que ficar a meio do caminho.

Por acaso do destino, Silva Porto cruzou-se com o explorador e missionário protestante inglês David Livingstone, que andava pelo Zambeze. Livingstone desejava apresentar-se na Europa como o primeiro europeu a visitar aquelas zonas, e ficou furibundo quando viu Silva Porto. No entanto, disfarçou, e, hipocritamente fingiu-se amistoso e sugeriu-lhe que desenhasse num mapa a posição geográfica do Bié e as rotas que percorrera para chegar até ali. Silva Porto não tinha preparação científica para desenhar mapas e disse-o francamente, então Livingstone exultou. De regresso a Inglaterra não pode deixar de referir a existência de Silva Porto, mas para evitar qualquer sombra na sua "proeza" declarou que Silva Porto era mulato e traficante de escravos! Assim, com falsidade declarada, o protestante Livingstone aparece nos livros de História de todos os países do mundo como o primeiro europeu que teve coragem e energia para percorrer o perigoso e misterioso interior do continente africano.
De Silva Porto ninguém fala, nem dos muitos outros portugueses que já por lá tinham andado ao longo de trezentos anos!
Silva Porto continuou a fazer viagens difíceis, perigosas, e complicadas. Encontrou-se com  exploradores estrangeiros, fartou-se de escrever para Lisboa a pedir ao governo que enviasse cientistas portugueses, oferecendo-se para os guiar, para ajudar e colaborar em tudo o que precisassem. 
Tinha consciência das suas limitações e não queria que Portugal ficasse atrás dos outros países. Ninguém lhe deu ouvidos senão muito mais tarde, em 1878, quando foi organizada a expedição de Hermenegildo Capelo, Roberto Ivens e Serpa Pinto.
No governo do Rei D. Luís I,  Silva Porto foi encarregado de pacificar tribos que se mantinham em constantes guerras. A isso juntavam-se os iminentes perigos de invasão estrangeira, mais uma vez Silva Porto solicitou ajuda da corte para uma intervenção militar na região. E mais uma não foi atendido e voltou-se para a agricultura. Criou duas fazendas uma na Embala de Belmonte no Bié e outra em Bemposta, próximo a Benguela. 
Na Embala de Belmonte Silva Porto desenvolveu a agricultura  e plantações de pomares como limoeiros, laranjeiras, romãzeiras e videiras (Idem, vol. XII, 7 Setembro 1862). 
Aprendeu a técnica quer para o plantio quer da colheita.  Os produtos cultivados na fazenda, Embala, de Silva Porto, alguns de origem europeia, eram encomendados aos seus credores da Metrópole e de Loanda, que enviavam uma pequena gama deles como chás e sementes (Idem, 5 a 6 Setembro 1862).
A  agricultura fazia parte da sua subsistência e, fundamentalmente, por ser um hábito da sua origem familiar. A finalidade que Silva Porto dava a produção das frutas europeias era a sua dieta alimentar na Embala e dos seus vizinhos com quem repartia e trocava os seus produtos: feijão, ervilha doce, trigo, grão-de-bico, espinafres, couve galega, pimentos, cenouras; por milho, amendoim, carne bovina, suína, caprina, leite e ovos. A actividade pastorícia também foi praticada por Silva Porto. A carne bovina, suína e caprina fazia parte da sua dieta. Ele próprio refere a sua estrutura: «[...] a missão do homem sobre a terra é trabalhar sempre» (Idem, 15 de Outubro de 1862). Muitos alimentos europeus passaram a fazer parte da alimentação dos Ovimbundus a partir dessa época.




Em 1862, quando viajava do Bié para Benguela, Silva Porto recolheu na flora da região espécies vegetais para introduzir na sua dieta: diversas espécies de cogumelos próximo do rio Kutatu (Cutato-no Huambo),e Uembe, todo o caminho estava alastrado de cogumelos ou owa como os ovimbundos, no dialecto umbundu, nominavam este tão útil vegetal [...] útil pela circunstância de servir para toda população.
Silva Porto aprendeu a distinguir os cogumelos venenosos como também outras espécies venenosas que recolheu. No total somavam trinta e três (33) espécies (Idem, vol. VII, 20 Dezembro 1862: 384-385).
A técnica de preparação da terra para a sementeira dos produtos era feita em conjunto com os  makotas (Idem, vol. VI, n.º 1241: 374).
Era habitual usar a farinha de peixe seco na falta de feijão e milho, para aprontar a nossa lavra (Idem, vol. VI, n.º 1241: 303). (makotas eram os indígenas do séquito dos sobas).
Silva Porto descreveu o seguinte: Fomos assistir hoje ao nosso trabalho agrícola, orientando os indígenas a preparar o terreno para a sementeira do grão, significando animação geral no trato da vida (PORTO Diário [Manuscrito], vol. VII, 6 Agosto 1862).
Esta cultura do grão e trigo era diversificada pelos fazendeiros em vários pontos do planalto central de Angola, onde se encontravam os seus estabelecimentos, nas margens do rio Cuito.
Em 5 de Setembro de 1862, Silva Porto começou a armazenar em celeiros o trigo, como referiu no seu Diário: "vamos apresentar ao nosso leitor, o resultado da colheita realizada em diversas ocasiões no correr deste ano: tendo acrescentar que a medida daqui regulada por alqueire e meio do litoral, ou dois alqueires pouco mais ou menos de Portugal." 
Os produtos de alimentação passaram a ser uma aproximação e união entre os elementos de diferentes comunidades. No caso de Silva Porto, a transição dos seus hábitos alimentares portugueses para os hábitos alimentares ovimbundu, exerceu uma grande influência na sua vida no Bié, sobretudo durante o seu processo de integração na região. Silva Porto consumia alimentos que eram produzidos no meio em que estava inserido. 
No final da época de 1870, fundou uma escola primária na Embala de Belmonte, com professor por si contratado em Benguela. Enquanto não chegou a nomeação oficial (que demorou dois anos) pagou do seu próprio bolso ao professor.

                                                          Belmonte, a escola na Embala de Silva Porto. 
                                         À esquerda Silva Porto e no centro o padre Joaquim Fidalgo com os alunos.

Na Embala de Belmonte, (Casa de Silva Porto em Belmonte, Bie) o sítio mais a leste onde flutua a bandeira portuguesa, há acolhimento certo para o explorador desinteressado ou comerciante audaz que demanda as terras do Leste. Como explorador experimentado, Silva Porto  dá conselhos a todos: que caminhos seguir, os maiores perigos a evitar, o nível dos caudais dos rios, animais perigosos, tribos inimigas, etc.  Ajudou Hermenegildo Capelo, Roberto Ivens e Alexandre de Serpa Pinto, que servem-se dos seus úteis conhecimentos e das suas boas relações com os nativos, para a tarefa que lhes foi incumbidaE, em boa fé ajudou o missionário protestante e explorador David Livingstone e o Anglo-americano Henry Morton Stanley. Chega mesmo a enviar os seus mais fiéis serviçais para os acompanhar. Apesar disso, o protestante Livingstone, ingrato e invejosamente, quando chega às terras do Alto Zambeze apelida Silva Porto de "vulgar negro". 
E mais: nos seus escritos, refere-se aos dois portugueses que encontrou (Silva Porto e Caetano Ferreira) como "mulatos ou negros selvagens incivilizados", omitindo que anteriormente Silva Porto o ajudara fornecendo-lhe informações valiosas e preciosos elementos de orientação. 
Frequentemente, Silva Porto atravessou o interior em caravanas vendendo mercadorias e participando em projectos para documentar a etnografia e a geografia do interior.  Depois de 1854 a sua actividade foi incessante. Em 1869 havia feito seis viagens para Lui e três para Benguela, onde comprou a loja local de Bemposta e permaneceu até 1879, quando retornou para Bié. Aos 62 anos de idade, mais uma vez cruzou a África Ocidental: viajou para Moio em 1880 e 1882, Lui (Barotseland) em 1883, e depois para Benguela em 1882 e 1884. 



Estas actividades foram interrompidas para uma viagem a Lisboa, para uma cirurgia aos olhos, durante o inverno e primavera de 1885, no regresso Silva Porto encontrou a Embala de Belmonte devorada por um incêndio, e todos os seus bens que acumulara com esforço e trabalho reduzidos a cinzas. Escreveu ao seu velho amigo Luciano Cordeiro: "Estou inválido e pobre. Não tenho pão e só ambiciono por consolação suprema a todas as minhas canseiras, poder morrer na pátria." 
Em 1877, a Sociedade de Geografia de Lisboa tinha feito um apelo especificamente para uma pensão, a fim de apoiar seu desejo de voltar a Portugal, onde poderia "morrer na pátria que teve honra e dedicadamente serviu".
A 5 de Março de 1889 foi substituído por Justino Teixeira da Silva como capitão-donatário do Bié, mas continuou a receber 100$000 réis por mês e manteve as honras associadas. 
Mas o "Ultimato Inglês" constituiu o seu golpe de misericórdia. Velho, empobrecido e doente reagiu muito mal quando em 1890 recebeu a notícia do “Ultimato Inglês”. A ideia de que Portugal ia retirar-se das terras entre Angola e Moçambique para as ceder à Inglaterra funcionou como um golpe final. E levá-lo-ia ao desespero.
                            
Em consequência da "Conferência de Berlim" tropas britânicas sul africanas e alemãs disputam entre si a Namíbia e surgem no baixo Cunene, a sul de Angola e norte da Namíbia. Na Angola Portuguesa a situação era tensa a sul do território, os indígenas instrumentalizados por ingleses, americanos e alemães estavam em revolta contra os portugueses. Silva Porto contrário a violências e sem protecção militar sentia-se abandonado no interior, na sua fazenda «Belmonte», perante uma revolta dos gentios que, com ele tinham convivido 50 anos, e com quem tinha partilhado os seus víveres e ensinado a ler e a escrever.
O capitão Henrique Mitchell de Paiva Cabral Couceiro, oferecendo-se então para realizar, como voluntário, uma comissão de serviço nas províncias ultramarinas, desembarca em Loanda a 1 de Setembro de 1889. Chegado a Angola foi logo nomeado comandante do Esquadrão Irregular de Cavalaria da Humpata, Huíla.
Em Janeiro de 1890  Paiva Couceiro chegou à área de Teixeira da Silva, no Huambo, com um contingente de 40 soldados moçambicanos armados, o que preocupou o soba Dunduna. Temendo que os portugueses estivessem ali para construir um forte e ocupar as terras, o soba foi convencido por Silva Porto de que estavam apenas de passagem, a caminho de Barotseland. Contudo Paiva Couceiro permaneceu na área até Abril, altura em que o soba Dunduna, ignorante, e incentivado pelos missionários protestantes americanos e ingleses a agir contra os portugueses, (desconhecendo os acontecimentos que após a "conferência de Berlim"  os ingleses, americanos e alemães preparavam para Angola), decidiu enviar um ultimato: “Paiva Couceiro e as suas tropas deviam sair do Bié na manhã seguinte.”
Paiva Couceiro indignado com estas exigências, enviou Silva Porto para negociar um entendimento com o soba. Acreditando que Silva Porto tinha alguma influência sobre ele.

Silva Porto tentou resolver as tensões, mas ficou desapontado ao perceber que pouco podia fazer, o chefe tribal estava do lado dos ingleses e americanos que o tinham conquistado com presentes entre os quais pólvora e armas. Silva Porto voltou desanimado, provavelmente acreditando que o “Ultimato britânico” tinha reduzido a influência portuguesa.
Havia bastantes anos já, que duas missões protestantes americanas e uma inglesa ali se esforçavam por fazer adeptos. Os interesses da  Santa Sé, aliados  de Portugal, apressaram o envio de missionários católicos a esta terra. A empresa não era das mais fáceis. Dificuldades de comunicação, má vontade da parte dos indígenas já trabalhados pelos missionários protestantes, tudo tornava muito precária a permanência dos portugueses no Bié. 
Porém, uma circunstância providencial mudou a situação. Uma revolta dos indígenas obrigou o Governo a organizar uma poderosa expedição a estas terras, em 1890, espalhando-se um salutar terror em toda a parte, e assim se fez a completa pacificação desta importante região.
Silva Porto voltando ao Huambo, perguntou sobre a certeza do Ultimato, o que irritou Paiva Couceiro. Mas depois, no Bié surgiu de bom humor. Paiva Couceiro reparou que na Embala de Belmonte tinha barris de pólvora a que, Silva Porto, rindo, declarou ser apenas areia. 
                                               Silva Porto "Antes a morte que a desonra".
A 1 de Abril de 1890, o velho explorador, comerciante, político, diplomatalevantou-se de madrugada embrulhou-se na bandeira portuguesa, e deitando-se sobre os barris de pólvora acendeu o pavio. Morreria no dia seguinte, dos ferimentos. Tinha setenta e dois anos. A sua morte é uma página indelével da História-Pátria.                                                                  
                                               Silva Porto foi um dos ícones da presença portuguesa em Angola.
O seu corpo foi transladado para a Metrópole, para a Sociedade de Geografia de Lisboa de onde saiu o seu imponente funeral para o Porto.      
                 A população do Porto durante o funeral de António Francisco Ferreira da Silva Porto (Silva Porto), 
                                                              para o cemitério da Ordem da Lapa, Porto.
No local do suicídio na Embala de Belmonte, foi erguido um Memorial em homenagem a Silva Porto (António Francisco da Silva Porto).  Desde 1890 até 1974, era um marco de referência de um Herói que morreu pela Honra em nome de Portugal.
Foto protegida(@copypass).

                                                                             Fotos protegidas(@copypass).
                                          

 Jardim e  Largo da República - cidade de Silva Porto.
  Foto protegida(@copypass).



António Francisco Ferreira da Silva Porto (1817-1890), foi um comerciante e explorador, diplomata e politico português que se notabilizou no interior de África. Durante décadas foi o único europeu que as populações do planalto do Bié conheciam, porque muito antes dos exploradores europeus atravessarem a África já este africanista português se tinha estabelecido como comerciante em plena selva angolana. A sua experiência foi preciosa para os comerciantes, exploradores e aventureiros que depois demandaram o interior de Angola. Foi figura icónica da presença portuguesa, reforçada com a sua morte trágica, suicidando-se pela honra do nome de Portugal, aos 72 anos, por altura do “ultimato britânico”.

 

                 Diário de Silva Porto.


                                                                               Diário de Silva Porto.


As anotações dos seus diários, Silva Porto – dedicou aos seus conterrâneos portuenses  Silva Porto conta em detalhes as sucessivas viagens que realizava. Tornando-se em autêntico roteiro sobre as vias de comunicação mais favoráveis no interior de Africa e de grande utilidade a exploradores, cartógrafos, geólogos e outros cientistas.
Silva Porto, meticulosamente registava em diários tudo que vê e ouve. Estes volumes (14 no total) continham variadas descrições da geografia, etnografia e antropologia da região, registos a que seu velho amigo Luciano Cordeiro se referiu como sendo “conversando com o papel", e acrescentaria "com sua escrita tensa e  tortuosa, que me lembra ziguezagues pelas florestas montanhosas, na sua língua quasi creola, às vezes, pelo longo isolamento no deserto, no qual ele passava muitas horas n'estas silenciosas palestras ... 
Os seus diários estão hoje na Biblioteca Municipal do Porto e outras obras como: Cinco Viagens ou costumes e usos gentílicos; Diários de meus apontamentos (1860); Notas para retocar minha obra assim que as circunstâncias permitam; Jornadas do alto Cassabi e país do Meio; Vocabulário quimbundo e Memorial de Mucanos. Encontram-se na Sociedade de Geografia de Lisboa, de onde saiu seu imponente funeral para o Porto.
Dos 14 volumes do seu diário, que constitui um magnífico repositório geográfico, étnico e antropológico daquela região de Angola, os diários de Silva Porto foram publicados nos "Annaes do Conselho Ultramarino". 
A este respeito, Silva Porto afirmava: "Se a minha obra fosse o que deveria ser, há muito que estaria publicada, e talvez em diversas línguas."   
As suas grandes  obras tornaram-no num autor muito famoso,  dedicava-se muito a elas, assim tendo oportunidade de ingressar nas Grandes Academias da Arte e ganhar prémios por sua inteligência.  

Nas linhas que marcam o itinerário existencial de Silva Porto sobressaem de imediato algumas notas: A precoce idade quando embarcou para o Brasil. O amor à sua terra natal que proclamou em decisões de forte simbolismo. 
Aos 18 anos, depois de sofrimentos e atribulações que a sua precoce emigração para o Brasil lhe acarretara, decide acrescentar ao nome de registo o topónimo das suas origens. Depois, a sua cidade esteve sempre presente de forma sublime nas suas expedições e viagens pelas selvas africanas, visto que o Diário onde registava as experiências quotidianamente vividas nas selvas foi dedicado aos seus compatriotas portuenses. E como seria justo o precioso documento encontra-se à guarda da Biblioteca Publica Municipal do Porto, distribuído por 14 volumes cujo título ( Viagens e apontamentos de um portuense em Africa) manuscrito 1235.
Outro sinal da sua dedicação ao Porto a decisão de legar à Santa Casa da Misericórdia o prémio pecuniário e a patente que a viagem de ligação entre Angola e Moçambique (1853-1854), presumivelmente lhe havia de proporcionar. A dádiva e o gesto têm mais valor pelas circunstâncias do momento: achava-se gravemente doente e, por isso, trata-se de uma espécie de última vontade.
 A Generosidade e Humanidade: Silva Porto repartia os produtos que cultivava entre os gentios; Silva Porto aprendeu o dialecto Umbundu e ensinava os gentios a falar e a  escrever  a língua portuguesa, durante um processo de alfabetização, ensinando todos os seus educandos da sua responsabilidade na Embala. 
No final da época de 1870, fundou uma escola primária em Belmonte, com professor por si contratado em Benguela. Enquanto não chegou a nomeação oficial (que demorou dois anos) pagou do seu próprio bolso ao professor.
                                           A sua Honradez! Silva Porto "Antes a morte que a desonra".   

                                Na Embala de Belmonte o Marco que sinaliza o lugar do suicídio de Silva Porto. 
                  Os portugueses restauraram a Embala de Silva Porto e cuidaram sempre da sua conservação.     
                                                                        Foto protegida (@copypass).
                                   



Para Imortalizar a memória deste grande português, António Francisco da Silva Porto, Belmonte foi baptizada "Cidade de Silva Porto".
Em 1902 é fundado o concelho do Bié, dependente do distrito de Benguela e a 2 de Janeiro de 1922 é criada a Câmara Municipal do Cuito; pelo decreto nº 134 de 1 de maio de 1922, do então alto-comissário Norton de Matos  surge o distrito do Bié tendo sido seu primeiro governador Manuel Espregueira Góis Pinto.
A 31 de Agosto de 1925, três anos após a criação do distrito do Bié, a povoação de Silva Porto era ainda a sede distrital, quando finalmente foi elevada a categoria de vila. Pelo diploma legislativo nº 740, de 1935, a vila foi elevada a categoria de cidade.                      


Em 1962-63 o Anuário de Angola, que glorificava os seus habitantes, refere-se à cidade como se segue: "A cidade de Silva Porto tem um aspecto gracioso e as estradas bem marcadas e, na maior parte recentemente asfaltadas, é electrificada e tem água canalizada, com uma estação de rádio e piscinas para a prática de desportos náuticos. Na cidade foi recentemente erigida uma estátua de bronze com 3,6 metros de altura, em homenagem a este grande Português ... há 2300 europeus, 1.900 mestiços e menos de 400 mil nativos".

A Cidade de Silva Porto é exemplo da mais excelente organização urbana - onde a inteligência administrativa soube erguer uma cidade quase perfeita - na província ultramarina portuguesa de Angola -.
 Silva Porto situada a altitude de 1.687m., era uma linda, moderna e airosa cidade de ruas e avenidas largas e bem delineadas, jardins floridos e arborizados que lhe davam encanto incomparável à bela capital do Distrito do Bié, com graciosas vivendas, variadíssimas repartições públicas, casas comerciais dos mais diversos ramos, mercado, hospital, uma linda igreja, hotéis, bares, pensões, clubes, cinemas, jardins, parque infantil, escolas, colégios, liceus, gráfica, piscinas, diversos bancos, etc., etc., em 1970 era uma cidade em franco progresso. Distava 7 quilómetros da sua estação ferroviária – Gare.

                                                                         Cidade de Silva Porto ano 1964.

  Estátua  a António Francisco Ferreira da Silva Porto.
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                           Banco de Angola e Monumento com Estátua António Francisco Ferreira da Silva Porto
                                                                             na cidade Silva Porto, Bié.
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                                                            Banco de Angola e Palácio do Governador do Bié.
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Nota de 20 escudos de Angola, dedicada a Silva Porto.


Praça do Prof. Dr. Marcelo Caetano, cidade de Silva Porto. 
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