Anzikus, também conhecidos como Yakas, Jagas, Yaccas, Imbangalas /M'bangalas, Bangalas.
A Ethiopia Inferior, abaixo da linha do Equador, chamada de tórrida zona
inabitável, alguns estimavam que era intolerável, e acreditavam que a cor negra
dos seus habitantes era por causa do calor e sol excessivo, e não
encontravam explicação que os brancos que iam da Europa nunca se tornavam
negros, nem seus filhos nascidos nesta Ethiopia são negros.
Essa miserável Ethiopia inferior, habitada por Anzikus (Jagas) oriundos da
Ethiopia Ocidental a 8 1/2 graus, território denominado
Mwene-Muji, fronteira com a tribo Melli ao norte da Serra
Leoa. Aqueles que escaparam dos rebanhos de leões, alguns deles mantiveram
a liberdade ao longo das margens do rio Bagamidir. Um povo de
pessoas horríveis, monstruosas e desumanas, selvagens, canibais e adeptos
de práticas de idolatria, mais cruéis do que os animais selvagens da
floresta e cobras venenosas. Que está sempre pronto para contar mentiras, pois
mentir entre eles é considerado grandeza. Um povo que está sempre pronto
para os assaltos, entre aqueles, um, que não rouba nem mata, não é homenageado.
Padre Dom Gonçalo da Silveira
Desde cedo mostrou espírito missionário, ingressando na Companhia de Jesus aos 22 anos de idade. Foram seus contemporâneos Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus, e São Francisco Xavier, deixando marca no seu percurso religioso.
Na sua missão de Evangelização em África, criou e alargou as missões jesuítas em Gamba (no Gabão), Tongue, passou por Angola, seguindo para Inhambane e Monomotapa onde foi bem acolhido, com ofertas e privilégios que ele recusa. Os navios ficaram 18 dias em Moçambique.
Os navios partiram então de Moçambique e chegaram a Goa a 6 de Setembro de 1556. O trabalho de Dom Gonçalo como Provincial da Índia envolveu-o imediatamente em Goa entre os seus compatriotas. “Os portugueses na Índia cresceram em sua maior parte e Dom Gonçalo também trabalhou para melhorar a situação dos índios convertidos ao cristianismo em Goa”. Na época havia cerca de 100 jesuítas no Oriente, dos quais 60 em Goa. Outro jesuíta, André Gualdamez, escreveu que durante a escala Dom Gonçalo foi debater com os muçulmanos, “que reconheceram que não lhe podiam responder” (Carta do padre Jesuíta Andrés Gualdámez, 1517-1562. (p. 391).
O seu desinteresse e desprendimento face aos bens materiais, rapidamente conquistaram o chefe de Monomotapa. Mais tarde, no entanto, por pressão de comerciantes muçulmanos de escravos – receosos da influência do Padre Gonçalo – o chefe dá ordem para o matar o Padre Dom Gonçalo da Silveira. Morre aos 40 anos de idade, depois de uma vida dedicada à busca do magis, que aprendera nos Exercícios Espirituais de Santo Inácio.
Luís Vaz de Camões no livro Lusíades, sobre
o Estado de Monomotapa em que Padre Gonçalo da
Silveira foi martirizado, escreveu:
Para onde vão os selvagens negros todos nus.
Gonçalo morte e insulto odioso aqui
Para a glória de sua Santa Fé deve saber .”
Dom Gonçalo da Silveira viria a ser o primeiro mártir em terras dessa Miserável Ethiopia Inferior, abaixo da linha do Equador.
Martyr Dom da Silveira, livro do Padre Jesuíta Cornelius Hazart.
Cornelius Hazart nasceu a 28 de Outubro de 1617 em Oudenaarde - Bélgica, faleceu a 25 de Outubro de 1690 em Antuérpia, também conhecido como Cornelius Hasart ou Cornelius Hasaert, foi um Padre Jesuíta, orador e historiador polémico. Ele se opôs ao protestantismo durante toda a sua vida. Além do sacerdócio, Cornelius Hazart dedicou quase toda a sua vida à luta contra os calvinistas nos Países Baixos. Sua publicação "Epistola ad Langgravium Hassiæ-Rheinfeldtium" mostra que ele também era activo na Alemanha. Na igreja jesuíta em Antuérpia, ele deu uma série de sermões sobre questões controversas. Ele proferiu alguns desses sermões na Grote Markt, onde os calvinistas também estavam presentes.
Para atingir seu objectivo perverso, ele aconselhou-se com os da sua tribo, os Muzimbos, e eles decidiram deixar sua própria pátria e sair para matar, saquear e não poupar nenhum ser vivo, nem mesmo um animal irracional. Eles viajaram para o leste da Etiópia, seguindo o curso rio Bagamidir localizado no interior da Etiópia, e do Nilo até chegarem à terra dos Mumba, tribo igualmente bárbara, sob as ordens do cruel chefe chamado Quizurra, era tão bárbaro e desumano que, para mostrar a sua crueldade e barbárie, Quizurra ordenou que os seus vassalos pavimentassem as suas casas com mortos que eles haviam massacrado em guerra como na paz, usando os mortos como pedras também a área da Praça. Eles também enterravam na barriga pedaços de carne desses mortos, e ornamentavam as paredes do “palácio” de Quizzura, com os mortos.
O rei árabe estava decididamente com medo, mas cingiu-se para a batalha e instigou seus vassalos a lutar. Considerando a barbárie e a crueldade usadas contra os lugares mencionados acima, o que os habitantes de Melinde não fariam com com eles. Em Melinde eles não encontraram um traidor para o seu objectivo, mas encontraram defensores prontos para proteger a cidade até o último suspiro.
A mulher do Dongij carregava sempre a filha Tem-ba-ndumba para treiná-la nas armas e barbáries da vida Jaga (algo que ela fez bem, a filha se tornou uma excelente mestra Jaga), quando a sua mãe viu a capacidade e as inclinações da filha durante a sua adolescência, o sangue e a barbárie brilharam, aumentando os seus bárbaros instintos na sua juventude.
Ela passou a ser concubina dos Jagas da tribo, teve um filho dos Jagas, deu-lhe o nome Marte, foi a sua mestra quando Marte tinha apenas dois anos, iniciando-o nas armas e barbáries da vida de um Jaga. Tem-ba-dumba, escrito também, graficamente, Tem-ba-Ndumba ou Tembandumba, rebelou-se contra a sua mãe para ter o poder sobre o kilombo Jaga, depois de tomar o poder cria as leis Jagas e as Quizilas.
As Quizilas eram regras de conduta dos rituais de feitiçaria, canibalismo, e adoração aos ídolos (leia-se demónios).
Tembandumba organizou os Jagas para a
guerra, exigindo que os recém-nascidos fossem
mortos por suas mães e seus corpos fossem
transformados em pomada que era misturada com ervas, a que davam nome
"maji-a-samba". Para cumprir esta lei ela reuniu a tribo e matou seu
próprio filho colocando o corpo num grande almofariz onde foi triturado e
transformado em pomada, de seguida ela esfregou a pomada no seu corpo,
declarando que isso a tornaria invulnerável. As mulheres da tribo imediatamente
imitaram a sua acção com os seus próprios filhos.
"Istorica descrizione de tre regni, Congo, Matamba et Angola", de autoria do
missionário capuchinho Giovanni Cavazzi de Montecuccolo.
De "Uncivilized Races" (Raças Não Civilizadas) do Rev. John George Wood, ano 1870.
Historiadores e missionários da época descrevem TembaNdumba como um ser abominável, repulsivo, e um monstro, tendo apenas um olho, tendo perdido o outro durante uma das suas guerras tribais. Nas suas leis Jagas e das Quizilas, viria a ter uma fiel seguidora na Jaga Njinga Mbandi dita Ginga ou Jinga foi igualmente um ser abominável, repulsivo, e um monstro.
O missionário capuchinho Cavazzi de
Montecuccolo narrou as origens fundadoras deste bando Jaga em que um chefe
chamado Zimbo percorreu vasta área da África Central destruindo povoações e
conclamando guerreiros para acompanhá-lo. Sua filha, chamada Tembadumba, a fim
de tornar seus vassalos invencíveis realizou um ritual chamado "magi-a-samba", em
que lançou seu filho recém-nascido num caldeirão e com um pilão esmagou a
criança até reduzi-la a uma pasta, à qual acrescentou algumas ervas e raízes.
Este unguento foi passado no corpo dos elementos da tribo para lhes dar forças
mágicas e imortalidade. O bando conclamou Tembadumba como líder do bando e
passou a seguir severamente as leis Kijilas, que no dialecto
ki-mbundo significa "proibição" o que não podiam fazer ou comer.
Tembandumba foi descrita em "As raças não
civilizadas"; sendo um relato abrangente de maneiras e costumes, e das
características físicas, sociais, mentais, morais e religiosas das raças não
civilizadas.
Ela capturava homens para seus amantes, que os mataria após um breve namoro. Acabou sendo envenenada por um dos seus amantes". "In Uncivilized Races" (Raças Não Civilizadas) página 616-617, do Rev. John George Wood, ano 1870.
No Congo fixaram-se perto a Mbata a este do rio Cuango; em Matamba (Lunda oeste) fixaram-se na região entre floresta e savana entre o rio Cuango e o rio Wamba (Maquela do Zombo); em Cassange região das Lundas (Lunda Norte e Lunda Sul) onde fundaram o domínio Jaga Kasanji de etnia Imbangala ou Mbangala
No Dongo fixaram-se em toda a região de Pungo Andongo; fixaram-se no Humbi no Cuanza Sul; ao longo do rio Cuanza; em Quissama e no Sumbe ao sul do Cuanza; no planalto central fixaram-se no Bié; em Benguela a oeste de Angola; na Huíla ao sul.
Estes Jagas Imbangala ou Mbangala eram também denominados Jaga Kasa, Jaga Yakas, Giapas e ainda outras designações conforme as áreas da sua incerta proveniência.
Os jovens capturados mais tarde participavam nos combates, tinham ordem de conseguir a cabeça dos inimigos, para mostrar ao chefe Jaga como prova dos seus feitos, pelo gesto alcançado, permaneciam mais tempo na tribo.
Eram, também, conhecidos por Imbangalas, Mbangalas, Yakas, ou kuyaka em kikongo, significa bárbaro, cruel. Alguns kongoleses para descrevê-los diziam: "Bawu, bayaka mbele; bayaka mpunza" significava “Eles agarram os cutelos que lançam contra eles”, “eles agarram as flechas voando”.
No século XVI, por volta de 1503 ou 1504, os primeiros mercadores portugueses tiveram conhecimento de um lugar rudimentar abaixo do Kongo onde os habitantes locais trocavam diversos artigos como pele de animais, anilhas em cobre, dentes de elefante, resina, madeira etc., por artigos europeus”; para chegar a este lugar tinham de passar por cima das pedras que despontavam das águas do rio, ao atravessarem o rio os mercadores portugueses avistando alguns habitantes locais e perguntaram o nome do rio, a que os mesmos responderam "Ma-lanji, Ngana" (são pedras, Senhor), os portugueses passaram a chamar Ma-lanji ao local", "ma-lanji" significa "pedras" no dialecto ki-mbundo. Os portugueses passaram a chamar Ma-lanji ao local".
O Kongo, governado pelo Manikongo Afonso Mbemba Nzinga, com ajuda dos missionários portugueses implantou o Cristianismo no Kongo, e proíbe rituais satânicos de feitiçaria e adoração aos deuses (leia-se demónios).
Entre as tribos Jagas que deixam o Kongo, consta Kabulu Matamaba ou Kambulu Matamaba, abandona o Kongo e instala o seu Kilombo na ragião do rio Ma-lanji, pela sua extrema crueldade Kabulu Matamaba era temido pelas tribos locais que denominaram o local "Matamaba" (abreviado Matamba).
Em Maio de 1660, em Matamba, iniciou a construção da igreja maior dedicada a Santa Maria. Muito versátil nas suas ocupações, Inácio também se dedicava à agricultura e a outras actividades laicas, as quais conciliava com o ensino do catecismo aos soldados e o combate aos feiticeiros locais.
O soba do Kilombo no Dongo, Ngola Nbambi, filho do Jaga-Imbangala Kiluanji kia Samba que durante anos envia pedidos aos Rei de Portugal para mandar missionários, dizendo que queria ser baptizado e, após o Rei Dom Manuel l satisfazer esses pedidos, enviando uma expedição com missionários sob comando e proteção do capitão D. Manuel Pacheco, o chefe tribal Kiluanji aprisiona os missionários e todas a tripulação da expedição, o capitão Manoel Pacheco ao recusar ser preso foi assassinado. Baltazar de Castro escrivão do Rei, foi feito prisioneiro e escravizado durante seis anos, foi libertado pelo Manikongo Afonso Mbemba Nzinga.
Em 1568, os Jagas voltam atacar S. Salvador, o soba regedor do Kongo, Álvaro Nímia Luqueni Ambemba e parte da população fugiu de S. Salvador e refugia-se numa ilha do rio Zaire, e pediu ajuda ao Rei de Portugal, D. Sebastião, que envia uma força de seiscentos soldados sob comando de D. Francisco Gouveia Sotomaior, mais uma vez, os portugueses derrotam e expulsam os Jagas do Kongo. Mas estes continuaram junto a fronteira e durante a década de 1570 eles forneciam mercenários para as tribos para a guerra civil. (Malaca, 31-12-1588 (Archivo Geral de Simancas, Secretarias Provinciales, Liv. 1551, fls. 413-413 v.)
Os Jagas foram descritos por estrangeiros e portugueses: missionários,
soldados, geógrafos, exploradores, comerciantes, soldados, governadores e
outras autoridades portuguesas entre os quais: Duarte Lopes, comerciante
português, que miraculosamente viveu no Kongo durante 6 anos. Em 1578
Duarte Lopes tornou-se embaixador do Papa Gregório XIII e do soba do
Kongo, Álvaro Nimi
em Ancanga. Ele defendia a necessidade de Missionários no Kongo, descreveu as
primeiras descrições sobre os Anzikus ou Jagas, os seus artigos foram
publicados por Fillipo Piafetta em 1591 e permaneceram uma das principais
fontes de informações sobre a Africa Central até meados do século XVI e XVII.
António de Oliveira de Cadornega (1623-1690), descreveu os Jagas,
crimes e as guerras tribais, no seu livro "História Geral das
Guerras Angolanas". António de
Cadornega foi um militar e historiador português. Com apenas 16 anos,
ofereceu-se como voluntário para a vida militar, embarcando para Angola no
mesmo navio que transportava o recém-nomeado Governador-Geral, Pedro César de
Meneses, chegou a Luanda a 18 de Outubro de 1639. Foi colocado no Forte de
Massangano durante 28 anos, foi promovido a capitão em 1649. António de
Cadornega reformando-se do exército, foi nomeado Juiz ordinário de Massangano.
E fez ainda parte do Senado da Câmara de Massangano e foi o primeiro provedor
da Misericórdia da vila. Em 1669, mudou a sua residência para Luanda, onde foi
vereador da Câmara até 1685. António de Oliveira de Cadornega faleceu em 1690,
em Luanda.
Confrontamos os lagos do imaginário
de Klaúdios Ptolemaios (Cláudio Ptolemeu, ou
Ptolemeu, 90–168) cientista grego que viveu em Alexandria, Egipto, com a
realidade de Duarte Lopes, comerciante português, explorador
e embaixador do Papa Gregorio XIII, e do soba regente do
Kongo Álvaro Nimi em Ancanga.
Cerca de três séculos antes da descoberta da nascente do rio Nilo, um homem
pela primeira vez na História chocou a Europa, revelando os horrores praticados
no Kongo. O seu testemunho não era imaginação, era realidade.
Decorria o ano de 1591 e, um livro causa
grande sensação e choque quer em Roma, como em toda a Europa. O livro era
"Relatione del Reame di Congo et delle Circonvicine Contrade", testemunhos
de Duarte Lopes, que miraculosamente viveu e sobreviveu naquele Kongo da África
Ocidental durante seis anos. Foi traduzido
para inglês, latim, francês, holandês, alemão e Italiano.
"RELATIONE DEL REAME DI CONGO ET DELLE CIRCONVICINE CONTRADE"
De Duarte Lopes
Em 1586, Duarte Lopes chega a Sanlúcar de Barrameda, Espanha, na foz do rio Guadalquivir, seguindo para Sevilha, na época um crucial centro de comércio, onde diversos cartógrafos portugueses se haviam estabelecido. Dali, parte para Portugal e depois para Madrid, para a corte de Filipe II de Espanha e I de Portugal. Usando o "hábito de burel grosseiro" dos peregrinos, cumprindo um voto feito durante a viagem, parte para Roma em 1589, com a finalidade de transmitir ao Papa Sisto V, os recados do soba do Kongo, que pedia que lhe fossem enviados missionários para não deixar esmorecer a fé Católica.
Um relatório sobre o soba do Kongo e região da África Central, era um tesouro de descrições de um reino e reis que só existiu na imaginação dos europeus.
Do missionário capuchinho, Giovanni Antonio Cavazzi de Montecuccolo.
Quem ler este livro não pode deixar de sentir calafrios.
Giovanni Antonio Cavazzi da
Montecuccolo (1621-1678), foi um missionário capuchinho e escritor
italiano, conhecido por suas viagens na Angola portuguesa do século
XVII, e por seu longo relato da história e cultura locais, bem como a história
da missão capuchinha em Angola.
Giovanni Antonio
Cavazzi nasceu em Montecuccolo em 1621, de pais nobres, aos 11
anos de idade ingressou na ordem capuchinha em 1632. Já em idade adulta, a
ordem propôs-lhe uma missão na África Central, Kongo/Angola, que ele
quase negou a oportunidade dessa missão africana, mas a missão acabou
prevalecendo graças à sua reputação de piedade e zelo.
A 11 de Novembro de 1654, Cavazzi integrado num grupo de 12 missionários capuchinhos, chegou a Loanda capital administrativa da Angola portuguesa.
Giovanni Antonio Cavazzi de Montecuccolo descreve o seu testemunho sobre os Jagas, crimes e suas guerras tribais durante o século XVII, (1654-1667).
O manuscrito de Giovanni Antonio Cavazzi da Montecuccolo “Istorica Descrizione de regi Congo, Matamba ed Angola”, estava na posse da família Araldi de Modena, Italia, o manuscrito foi descoberto nos arquivos da família Araldi (MSS Araldi) foi publicado postumamente em Bolonha em 1687, uma segunda edição apareceu em Milão em 1690. E há muito reconhecido como uma fonte para a historia e a sociedade angolana do século XVII. São mais de 1.500 páginas de fólio. Felizmente para os leitores, o conteúdo útil do material está em um número consideravelmente menor de páginas.
O relato do missionário Cavazzi de Montecuccolo, vem da sua experiência pessoal acumulada durante os treze anos que permaneceu em Angola na África Central (1654-1677), e de dados colectados de outros missionários e informadores locais, de pesquisa documental de cartas escritas por clérigos, congoleses e Autoridades portuguesas, para além da consulta de textos legais e narrativos anteriores é, em parte, o testemunho de um narrador participante.
O capuchinho Cavazzi de Montecuccolo deixou-nos uma descrição quase, etnográfica, desta etnia que invadiu Angola no século XVII. Cavazzi registrou seus mitos, ritos, juramentos, crenças, formas de habitáculo e alimentação como se fossem únicos para todos do bando. E relatou, segundo as tradições que viu e ouviu no tempo que viveu em Angola, que os Anziku, Jagas, teriam vindo de Serra Leoa.
O Missionário Capuchinho Cavazzi viu nos Jagas o próprio
diabo e suas práticas de idolatraria aos seus
deuses (leia-se demónios), foram traduzidas como “seitas
demoníacas”.
“Istorica Descrizione de regi Congo, Matamba ed Angola”, Cavazzi.
A conduta dos Jagas, era assente na mais extremada selvajaria, regulada por ancestrais normas estabelecidas por uma mulher, chefe tribal Temba-Ndumb, as quais visavam que os Jagas fossem implacáveis contra os inimigos e fossem ávidos de carne humana” (de Giovanni Antonio Cavazzi de Montecuccolo).
"É uma gente de cuja boca sai continuamente a mentira e a falsidade, sempre dada ao roubo e a qualquer crime. É um povo sempre sedento de sangue e de carnificina, ávido devorador de carne humana, feroz contra as feras, cruel para com os inimigos e até contra os próprios filhos. Numa palavra: parece animado por sentimentos tão maus que o inferno nunca vomitou fúrias e tiranos que possam servir de comparação" (Cavazzi de Montecuccolo - I, p. 175).
"a prática do infanticídio, dos sacrifícios humanos e do canibalismo. Eles poderiam ter começado sua devastadora migração num local qualquer do território denominado Mwene-Muji, perto das nascentes dos rios Nilo e Zaire, ou proviriam das montanhas de Serra Leoa. Teriam sido conduzidos no princípio por um guerreiro denominado Zimbo, e depois pela mulher Tembadumba, percorrendo várias localidades até penetrarem e atacarem o reino do Congo: Devastando todo o reino e aumentadas as suas fileiras com os vencidos, que não tinham outra alternativa para não serem mortos, os jagas saíram, inundando os países limítrofes com um mar de sangue, e penetraram na Abissínia, que está situada no lado oposto da África" (Cavazzi de Montecuccolo - I, p. 175).
"Junto com o infanticídio, a antropofagia e os sacrifícios humanos
serviram de base para os elementos essenciais das regras de convivência entre
os mbangalas. A denominação dessas regras, kesila, kisila ou quijila,
(feitiçaria) provinha do dialecto Kimbundo (quimbundo). Os adeptos das
regras do Kilombo (quilombo, lugar escondido na mata) os feiticeiros para
ganharem mais poder, ensinam a quem lhes aprouvesse uma quantidade de segredos,
mesmo inventados, e prometiam aos doutrinados que nunca poderiam ser atingidos,
feridos, envenenados ou mortos" ( Cavazzi de Montecuccolo
- I, p. 185).
"De modo similar, identifica o valor do culto nos ancestrais da comunidade, os defuntos, a quem "preparam cuidadosamente diversas comidas nas covas correspondentes à cabeça dos cadáveres, sacrificando para isso homens e animais", e que o espírito dos defuntos entrava no corpo do feiticeiro "manifestando os seus desejos e as suas necessidades" (Cavazzi de Montecuccolo - I, p. 185-186).
"Os adversários vencidos eram sacrificados por ocasião de rituais funerários, no dia da cerimónia eles eram coroados com grinaldas, recebiam cumprimentos e obséquios dos presentes, súplicas para que intercedessem pelos vivos, e depois eram executados e devorados. aos chefes estava reservado o direito de comer o coração dos principais inimigos" (Cavazzi de Montecuccolo - I, p. 184, 195).
"Os Jagas, para maior alívio da alma dos finados, depois de sacrificarem homens e animais, penduram os corpos das vítimas com a cabeça para baixo, sobre a campa, e cortando as cabeças, deixam que todo o sangue caia sobre a mesma. Por fim, cortam todos os outros membros para que qualquer resto de sangue seja também derramado. Durante esta supersticiosa cerimónia porém, não cuidam da sede do falecido, mas também na sua própria, pois enchem de sangue algumas taças e bebem-no avidamente" (Cavazzi de Montecuccolo- I, p. 187).
"Jagas, canibalismo:
O surgimento dos Mbangalas, no passado, e as modificações introduzidas na estruturação do quilombo no decurso de um século de história.
O missionário capuchinho informa que, quando entrou no quilombo de Cassange em 1660, os indígenas invocavam o espírito de uma entidade chamada Pando, que se manifestou por possessão de um feiticeiro. Na preparação do sacrifício exigido pelo espírito, a carne de dois indivíduos sacrificados foi misturada ao sorgo com produtos naturais ou fabricados (sorgo; bebida feita de cana de palmeira), depois, posta a ferver e distribuída aos presentes. Os feiticeiros matam homens e bebem-lhe o sangue misturado com vinho" (Cavazzi de Montecuccolo, - I, p. 208-209).
"O infanticídio ou abandono dos filhos nas selvas eram prática destes povos sedentários, os Imbangalas ou mbangalas da segunda metade do século XVII em sua reestruturação social, se mesclaram às dos povos bakongo e mbundu" (Cavazzi de Montecuccolo- p. 209).
Andrew Battel descreve os Jagas como os maiores canibais do mundo, pois se alimentam principalmente de carne humana, apesar de disporem de todo o gado daquele país. Descreve ainda: Eles tiram quatro de seus dentes, dois de cima e dois de baixo, para amedrontarem. [...] As mulheres são muito férteis, mas assim uma criança nasce, esta é enterrada rapidamente, ainda viva, para que não haja nenhuma criança a ser criada no Kilombo Jaga.
Andrew Battell, participou das guerras dos Jagas e descreveu o carácter marcial dos Jagas, quando eles atacam aldeias capturam os adolescentes que os levam com eles. Mas os homens e mulheres eles matam e comem. Os adolescentes são treinados nos rituais Jagas para a guerra, e penduram um colar em seus pescoços que nunca é tirado até que o adolescente traga a cabeça de um inimigo para o chefe dos Jagas. Os seus rituais e seus monumentos dos quais o principal situava-se no centro da tribo e se chamava Quesango (uma árvore ou uma figura de um qualquer demónio esculpida em madeira) em torno dele estavam os crânios dos vencidos ali sacrificados junto com sangue de animais e óleo de palma". (Ravenstein - p. 33).
Jan Vansina ( historiador e antropólogo belga, 1929-1017) notou que a prática de matar as crianças recém-nascidas possibilitava maior mobilidade dos jagas, que viviam em estado permanente de guerra, os recém-nascidos representavam um empecilho ao deslocamento dos atacantes. Assim o infanticídio representava a possibilidade do progresso dos grupos Jagas. As mulheres não eram autorizadas a criar os filhos que tivessem, e nem podiam dar a luz no Kilombo nem no espaço circunvizinho ao Kilombo (Kimbo), em caso que acontece-se estavam sujeitas à pena de morte.
"O costume da antropofagia e dos
sacrifícios humanos não ocorria ao acaso. Integrava-se a rituais periódicos que
seguiam uma forma e produziam significados muito particulares aos membros do
grupo. A relação entre feitiçaria e canibalismo podia ser observada em diversos
povos de dialecto kikongo e kimbundu, na crença de que determinados feiticeiros
e sobas comiam o coração de suas vítimas para adquirir poder, crença
transferida para o Novo Mundo " (Thorton, Childs, - p. 276).
Gravuras do holandês Pieter de Marees.
DE BRY, Johann Theodor e Johann ISRAEL-África, Kongo 1598-1613]
Quando morria um chefe Jaga, os seus vassalos mais
íntimos para garantirem que ele não tenha nada no mundo seguinte; eles matavam
toda a sua família e servos e enterravam-os no túmulo do chefe junto com as
suas armas. Colocavam pratos de comida no túmulo como oferendas, e
modelavam as cabeças dos servos mortos com argila e colocavam-nas em estacas ao
redor do túmulo, enquanto um ou dois guardas (mostrados em ambos os lados do
túmulo) vigiam o local. [Gravura a partir dos relatos de testemunhas
oculares do holandês Pieter de Marees. DE BRY, Johann Theodor e Johann ISRAEL-África,
Kongo 1598-1613]
Kongo, Jagas - sacrifícios humanos. Gravura "In Uncivilized Races" (Raças Não Civilizadas) do Rev. John George Wood, 1870. |
Outros registos deixados por escritores europeus anteriores a Cavazzi de Montecuccolo confirmam o teor dramático das incursões dos Jagas no Kongo em 1568, onde causaram profunda devastação, desorganizando-o e gerando situação de dificuldade generalizada, o que forçou o soba Manikongo Álvaro Nimia Luqueni Amvemba a pedir ajuda ao Rei de Portugal, no que foi atendido com o envio de uma tropa armada de 600 homens sob comando de D. Francisco Gouveia Sotomaior que retornou ao Reino de Portugal em 1574.
A história do Congo/Angola ficaria marcada pelas atrocidades, crueldade, desumanidade, canibalismo, terror e devastação praticada pelos Jagas, Dembus, e Bakongos.